Se existe algo que aprendi em 8 anos como gerente de tecnologia de informação em uma empresa de nutrição e fisiologia agrícola, a Compass Minerals, e em outros 4 anos na cooperativa Castrolanda, é que vivemos em um país de primeiro mundo. Pelo menos no campo. Em grande parte, graças à transformação digital do agronegócio no Brasil.
Vejamos como exemplo a produtividade da safra de grãos, que quase dobrou em 15 anos, sem aumentar muito a área de cultivo. Primeiramente vamos aos números, para depois mostrar como a transformação digital do agronegócio impulsionou nesses resultados.
Segundo dados da Conab, a chamada 1ª Safra, de Verão, tinha aproximadamente 40 milhões de hectares cultivados no Brasil na safra 2004/05. Considere cada hectare equivale a 1,1 campo de futebol. Na Safra 19/20 eram 45,4 milhões. Já a produtividade média era de 2.339 quilos por hectare em 04/05, e bateu 3.864 kg/ha em 19/20. Isto é 65% a mais. Perceba quanto crescimento de produção sem a necessidade de abrir novas áreas de plantio, o que poderia ter gerado grande impacto ambiental.
Motores da transformação digital do agronegócio no Brasil
Como resultado dessa expansão, o agro é responsável por quase 25% do PIB nacional. Por outro lado, traz para o Brasil grande parte do desafio da segurança alimentar global. Afinal, a FAO-ONU (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) projeta mais de 9,5 bilhões de pessoas no planeta em 2050.
Além disso, é importante lembrar que o campo é a matéria-prima de quase tudo. De madeira e celulose para habitação a materiais de educação, de algodão para tecidos a cana e milho para etanol, por exemplo. Nesse sentido, precisamos destacar alguns motores e exemplos da transformação digital do agronegócio no Brasil:
- IoT ou Internet das Coisas: sensores para compartilhamento de dados em tempo real na agropecuária vêm colaborando para melhorar o ambiente de bem-estar animal, de bois a peixes. Um exemplo disso são startups como a IoFish e a Tatilfish. Elas fornecem aplicativos para produtores de tilápias com informações sobre níveis de oxigênio, de PH e da temperatura da água dos tanques.
- Agricultura de precisão: a partir da coleta de materiais do solo e de plantas. Com isso, em poucos minutos, os produtores podem identificar a necessidade de reforçar a presença de minerais ou utilizar defensivos agrícolas de forma direcionada.
- Satélites, veículos e drones estão cada vez mais presentes para apoiar a produtividade no campo. Startups, cooperativas e consultorias que utilizam informações de satélites, por exemplo, podem auxiliar seus clientes com informações sobre o desenvolvimento da lavoura. Nesse sentido, drones podem ser utilizados tanto para observação quanto para aplicação exata de agroquímicos em talhões de plantio específicos.
Por consequência, termos como machine learning e big data, por exemplo, entraram no dicionário de agrônomos e produtores rurais. Isso revela que não é só o que ocorre dentro da porteira que importa. Mas os profissionais estão realmente acompanhando essa evolução?
Uma visão de futuro: só isso não é suficiente
Tanta tecnologia só é possível porque, cada vez mais, conseguimos capturar dados do ambiente de trabalho no campo. Neste sentido, percebemos na prática como funciona e o que é a transformação digital no agronegócio: significa coletar informações, cruzá-las e utilizar as variáveis que temos disponíveis para melhorar a produção. Porém, há variáveis que [ainda] não estão sob controle humano e trazem incertezas aos produtores.
Acima de tudo, nesses anos de vivência com produtores e profissionais da agronomia, percebi certa resistência e aversão a riscos. O medo da chuva, da estiagem, da geada, ou seja, o maior temor é quanto ao clima. Por mais que tenhamos avançado bastante na capacidade de previsões de clima, de anos de El Niño e La Niña, isso ainda não é o suficiente. Igualmente, existe o receio de testar coisas novas, ainda não comprovadas e testadas Brasil afora.
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Acima de tudo, esse temor é compreensível. Afinal, ninguém quer colocar uma safra a perder, bem como arriscar seu rebanho. Nesse sentido, penso que a viabilidade, a criação de linhas de créditos acessíveis e seguros agrícolas para inovações no campo podem ser uma solução para mitigar esses riscos.
Além dos bancos, cooperativas de crédito têm aqui uma grande oportunidade. Elas podem conectar startups a produtores rurais, assim como universidades e cooperativas agrícolas em destinar espaços de experimentação em parceria com produtores rurais. Inclusive, exemplos de cooperativas com potencial de inovação não faltam, e um bom exemplo em franca expansão é a Cresol.
Sucessão no campo e conectividade
Além disso, julgo que a sucessão no campo, ou seja, a passagem de bastão para as novas gerações pode ser determinante. Digo isso não apenas pela disposição em utilizar novas tecnologias. Mas pela oportunidade de – cada vez mais – esses jovens levarem as informações de dentro da porteira para fora dela.
Não só a conectividade da internet traz essa praticidade, bem como o fato de que cada vez mais cidades pequenas e médias têm técnicos e agrônomos de cooperativas, laboratórios e profissionais da Embrapa próximos. Produtores rurais precisam usar e abusar dessas consultorias. E anotar tudo. Tudo mesmo, pois é preciso reforçar que um dos pilares da transformação digital no agronegócio está conectada ao uso de informações antes genéricas.
Inovação aberta e transformação digital no agronegócio
Sob o mesmo ponto de vista, tantas informações acabam sendo o ponto de partida para ideias de startups do agro, as AgTechs. O Radar AgTech Brasil identificou 1.125 delas em 2019. Como startups têm, por característica, aprender por tentativa e erro, elas são essenciais para o desenvolvimento de novas tecnologias e a transformação digital do agronegócio.
Neste sentido, se você ainda não está convencido sobre a importância de registrar tudo (boas e más práticas, fotos de pragas e plantas com bom desenvolvimento, histórico de produtividade), tenha em mente a evolução da transformação digital do agronegócio:
- Fora da porteira: existe toda uma cadeia de pesquisa e desenvolvimento que pode ser fornecida por empresas do agronegócio que apoiam a inovação aberta e, claro, por startups. Por exemplo, veja este case que surgiu de uma parceria de nós da Haze Shift com a BRF Ingredients. O resultado pode ser equipamentos, insumos e inovações em serviços para o produtor;
- Dentro da porteira: utilizar ferramentas, aplicativos e registrar tudo é essencial para melhorar a produtividade. Sem dúvida, as novas gerações, que estão assumindo o campo, precisam apostar no monitoramento;
- Depois da porteira: a aceitação pelo consumidor e a qualidade dos produtos que surgem a partir do que é produzido dentro da porteira é tão importante quanto a produção propriamente dita. Neste sentido, a rastreabilidade é um diferencial para fortalecer a marca do produtor rural. A produção de cafés especiais da 3 Corações, por exemplo, aposta nisso para vender produtos Premium. Como consequência, valoriza os produtores. Veja este exemplo:
O agro moderno é sustentável!
Por fim, perceba que essa imensa transformação digital do agronegócio está intimamente ligada não apenas à segurança alimentar, mas também aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da ONU.
A alta produtividade colabora com a agricultura sustentável e a mitigação da fome, e também com a erradicação da pobreza, pois dá oportunidade a pequenos produtores. Uma boa alimentação é sinônimo de saúde e bem-estar. O bom uso da água potável (inclusive com captação de água da chuva) e o saneamento também entram na lista, pois a agricultura é a maior consumidora de água do Brasil.
E temos, claro, a questão ambiental. Podemos mencionar alguns exemplos de redução no impacto ambiental por meio da transformação digital no agronegócio:
- O aumento da produtividade sem a necessidade de abertura de novas áreas de plantio ou pastagem, a partir da análises de solo com recursos digitais e até mesmo via satélite,
- Capacidade de aplicação de agroquímicos em áreas específicas por drones;
- Monitoramento de ambiente do gado e de plantio em áreas de madeira – o que é tecnicamente conhecido como Integração Lavoura-Pecuária Floresta (ILPF);
- Potencial de medição de áreas via satélite para observar adequação à legislação ambiental que exige uma área de preservação de mata nativa, conforme o bioma.
Tudo isso valeria, inclusive, um artigo específico sobre a transformação digital do agronegócio e seu impacto na questão ambiental e no fluxo da sustentabilidade.
Ademais, tudo isso significa crescimento econômico, inovação e consumo responsável. E nós da Haze Shift estamos prontos para apoiar empresas, cooperativas, organizações e produtores rurais. Tanto para o cumprimento das ODS quanto para a inovação aberta. Seja dentro ou fora da porteira, nossos cases de sucesso comprovam nossa capacidade em desenhar as melhores soluções para a transformação digital do agronegócio.