O Conselho Federal de Medicina (CFM) suspendeu novas regras para telemedicina. Sim, é isso mesmo que você leu. Esta notícia rodou os veículos de comunicação em fevereiro de 2019, depois de o órgão revogar a Resolução nº 2.227/18 que atualizava a Resolução nº 1.643/2002 após a manifestação contrária de diversas entidades de classe e profissionais médicos. 

O debate sobre telemedicina seguiu até que em dezembro deste mesmo ano o mundo foi tomado pela notícia de uma nova doença, a COVID-19. O que veio depois todos sabemos.

Agora vamos dar um salto de três anos, para dezembro de 2022. O então Presidente da República sancionou a Lei Federal nº 14.510/2022, que regulamenta a prática de telessaúde no Brasil. Isso  abrangeu a prestação de serviços remotos (não presenciais) em saúde por meio de tecnologias da informação e comunicação, não sendo exclusivo para Medicina. Desta forma, a Telemedicina se torna parte da telessaúde, ficando sob responsabilidade do CFM regulamentar a atuação técnica e ética do profissional médico nesta modalidade. 

O CFM, uma das diversas entidades de classe que participaram do debate da PL 1998/22 (que originou a lei 14.510) em maio de 2022 publicava a Resolução CFM nº 2.314/22 definindo o cenário de atuação do profissional médico.

E por que saber isso é importante? Em primeiro lugar porque a legislação é essencial para que as organizações de saúde e os profissionais da saúde 4.0 estejam alinhados com a transformação digital e sobre o que podem e não podem fazer. Portanto, vamos saber o que a lei nos diz? 

Destaques da Lei 14.510 sobre telemedicina

Com a Lei a autonomia do profissional de saúde fica assegurada, bem como o direito de recusa ao atendimento remoto por parte do paciente. Nesse sentido, são alguns dos principais pontos da telemedicina:

  • Autonomia do profissional de saúde;
  • Consentimento livre e informado do paciente;
  • Direito de recusa ao atendimento na modalidade telessaúde, com a garantia do atendimento presencial sempre que solicitado;
  • Dignidade e valorização do profissional de saúde;
  • Assistência segura e com qualidade ao paciente;
  • Confidencialidade dos dados;
  • Promoção da universalização do acesso dos brasileiros às ações e aos serviços de saúde;
  • Estrita observância das atribuições legais de cada profissão,
  • Responsabilidade digital.

Universalização do acesso

Mas aqui deixamos uma pergunta: 

Como fazer a expansão dos serviços de telessaúde avançar? Um dos desafios, é sem dúvida tornar esse recurso disponível em qualquer lugar. Nesse sentido o Brasil avança, porém ainda há uma parcela da população sem acesso à internet. Segundo dados da ANATEL, a telefonia móvel cobre todos os municípios brasileiros, mas nem todos possuem acesso à internet. Segundo relatório da empresa DataReportal especializada em estudos globais sobre internet, 77% da população brasileira possui acesso à internet, posicionando o Brasil no 33º lugar no ranking global de cobertura de internet.

À medida que toda população vai tendo acesso a redes de internet com qualidade a disponibilidade dos serviços de telessaúde vão se ampliando. Parte dos usuários da saúde suplementar já utilizam algum serviço de telessaúde enquanto ainda uma pequena parcela dos usuários dos serviços públicos têm ou tiveram esta mesma experiência.

Cultura da Inovação na telemedicina: telessaúde  

Outro ponto a destacar é a cultura de uso dos serviços de saúde, tradicionalmente estabelecida pelo contato presencial. Sem dúvidas a transformação digital vem alterando esse quadro mas precisamos dar o tempo correto para a adaptação aos novos serviços. Obviamente a tecnologia não substituirá o contato presencial, mas poderá ajudar muito a aliviar a tensão permanente da atenção básica, porta de entrada para o sistema de saúde, considerando a alta concentração demográfica dos centros urbanos que sobrecarrega o sistema, seja na saúde suplementar ou pública.

Em outras palavras, a transformação digital pode reduzir as filas enfrentadas por uma grande parte das pessoas que buscam atendimento tanto no SUS quanto na rede privada, por meio da descrição dos sintomas remotamente. Assim, os pacientes são encaminhados de uma forma mais ágil para o especialista que precisam consultar. E isso inclui a possibilidade de, por meio da triagem remota, fazer o encaminhamento para uma consulta presencial ou via telemedicina. 

Parte desta transformação pode ser observada pelos dados do levantamento realizado pelo Research Center, núcleo de pesquisa da Ayfa, o maior ecossistema de educação em saúde e healthtechs do Brasil. 

Segundo a pesquisa, 54% dos médicos de consultórios e clínicas realizam teleconsultas. O levantamento também traz outros números interessantes como: 

  • 76,7% dos entrevistados utilizam softwares/plataformas de prontuário eletrônico e gestão do consultório; 
  • 67,9%, ferramentas de suporte à decisão clínica, e 67,5%, plataformas de prescrição digital;
  • Entre 2020 e 2021 mais de 7.500.000 atendimentos médicos foram realizados por telemedicina segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Telemedicina e Saúde Digital. 

Tendências para 2023

O ano começa sinalizando que 2023 será positivo para a saúde digital e a telemedicina. 

Os primeiros discursos indicam que iniciativas de ampliar os serviços de tecnologia e telessaúde serão pauta corrente para o Ministério da Saúde, o que poderia ampliar o acesso da população a esses serviços através do SUS. Nesta agenda, como consultor de inovação e alguém que vive o dia a dia como empreendedor de healthtech, destaco o debate sobre a estruturação do Open Health e Telessaúde, um desafio por envolver todas as camadas de atendimento (público e suplementar), infraestrutura e segurança de dados. É esperar para ver…

Já do ponto de vista corporativo, a necessidade por equilibrar a saúde financeira com o desempenho competitivo deve elevar os investimentos na área de tecnologia e inovação. Destaco maior aproximação com as healtechs, projetos envolvendo inteligência artificial (IA) para análise de dados e suporte à tomada de decisão, interoperabilidade, aumento do uso de dispositivos médicos wearable (vestíveis) desde que devidamente validados, ampliação das cirurgias robóticas, porém com o desafio de redução dos custos e a digitalização de processos e da cadeia de serviços.

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Além disso, alguns temas serão frequentes, mas ainda com aplicabilidade limitada como: MetaHealth ou metaverso na saúde, uso da bioimpressão 3D e a experimentação de soluções com a utilização do 5G na transmissão de dados.

Todas estas possibilidades estarão nos provocando de alguma forma e só terão eco se profissionais, usuários, corporações e governos trabalharem fortemente a cultura da inovação em seus cotidianos. Mindset flexível, visão de futuro e engajamento são pilares fundamentais para que a transformação digital na saúde avance. E nós na Haze Shift podemos te ajudar nesta jornada.

Escrito por:

Cristiano Teodoro Russo
Cristiano Teodoro Russo
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Consultor associado na Haze Shift. Professor (inovação em saúde), Co-fundador na AtendeDoc, Presid. da Ass. Bras. de Startups de Saúde, Especialista em tecnologia e inovação na saúde. Apresentador do Programa MOVE sobre inovação e startups na TV Tarobá/Band PR.