Em toda minha trajetória profissional sempre cultivei o hábito de leitura, o que me ajudou a compreender o comportamento das pessoas nas organizações, especialmente diante de mudanças ou novidades. Ao longo dos anos, temos percebido um movimento cada vez maior das empresas em busca da inovação. Olhando para a estrutura e cultura organizacional, elas se deparam com inquietações, hesitações e se vêem num dilema da inovação ao longo desta jornada.
Nesse sentido, renomado pesquisador em estratégia e inovação, Vijay Govindarajan, já dizia: “As organizações não são construídas para a Inovação, muito ao contrário, são estruturadas para as operações de curso contínuo, são construídas para serem máquinas de desempenho”.
O que temos observado constantemente são organizações que sofrem, muitas vezes de forma inconsciente, do que o autor Clayton M. Christensen chama de Dilema da Inovação: proposto por Christensen no livro de mesmo nome. O autor destaca que até mesmo organizações bem sucedidas têm sérias dificuldades de repensar seus modelos de sucesso, questionar suas crenças e seu mercado. Ou seja, não conseguem se atualizar e invariavelmente acabam fracassando. Esse é o dilema da inovação.
Costumo dizer que toda empresa tem de ser viável, especialmente financeiramente, pois é o que financia e possibilita tudo mais acontecer. É exatamente neste ponto onde os dilemas ocorrem quando se foca apenas no resultado de curto prazo e a todo custo. Afinal, o mundo gira e as coisas mudam, e isso pode comprometer a sustentabilidade da organização no longo prazo. Portanto, há uma incompatibilidade entre operação e inovação no dia a dia das empresas, o que é algo perfeitamente natural. Entretanto, não quer dizer que sempre deva ser assim.
Para combater o Dilema da Inovação
Existe um termo que define pessoas que possuem a capacidade de serem hábeis, em mesmo nível, com ambos membros do corpo (como escrever ou chutar uma bola com ambos os membros, esquerdo e direito): este fenômeno é conhecido como ambidestria, uma palavra com origem no Latim onde ambi significa “ambos” e dext significa “certo”.
Seguindo esta mesma lógica, a ambidestralidade organizacional é definida como a habilidade de organizações equilibrarem ações de Exploração, estas mais ligadas a inovação (pesquisas, experimentações, descobertas), e ações de Explotação, aquelas ligadas a melhoria da performance daquilo que já é conhecido (melhorar, selecionar). Ambas são fundamentais para a continuidade e sustentabilidade das organizações.
Especialmente nos dias atuais, frente a inúmeras novas tecnologias e novos modelos de negócios, as organizações precisam desenvolver esta capacidade de serem ambidestras. Ou seja, para enfrentarem o Dilema da Inovação, elas precisam ser competentes em repetir o modelo de negócios de sucesso conhecido, com excelência operacional cada vez maior e constante, porém sem deixar de inovar, questionando a todo momento este mesmo modelo de negócios e produtos estabelecidos.
Afinal, não podemos deixar de lembrar o célebre case da gigante Kodak, que não desenvolveu sua capacidade de ambidestria e entrou em uma espiral de declínio impressionante, entrando com um pedido de falência em 2012.
Em seu ápice, nos anos 70, a Kodak chegou a deter 90% do mercado de filmes, 85% das câmeras fotográficas nos Estados Unidos e contava com uma força de trabalho de 100.000 trabalhadores em todo mundo. Contudo, a empresa, que tinha seu modelo de negócios baseado em grande parte na venda de rolos de filmes, resistiu a inovar e entrar no universo de câmeras digitais a partir dos anos 90. Viveu o Dilema da Inovação e optou por não inovar.
Casos como o da Kodak podem ser evitados ou ao menos serem previstos, desde que haja uma decisão de se ter a inovação no cerne da estratégica. Isso passa por se promover uma forte cultura orientada à inovação e a revisitar constantemente os próprios modelos de negócios, por mais desafiador que seja equilibrar isso no dia a dia.
Um exemplo a ser seguido: Usina São Martinho
A Usina São Martinho é um ótimo exemplo de como é importante revisitar o modelo de negócios e a própria cultura organizacional. A companhia é um dos maiores grupos sucroenergéticos do Brasil e sempre teve como diferencial estratégico sua eficiência operacional, sendo considerada um benchmarking mundial no segmento.
Na última revisão de suas estratégias, a empresa definiu que precisava agregar uma nova tese de inovação como direcionador-foco para os próximos anos, a qual representaria um grande diferencial com vistas à sustentabilidade da organização. Esta nova tese é chamada São Martinho Inova, que foi quando a organização entendeu que seria necessário a ampliação do conceito de inovação, a partir de sua cadeia de valor e apoiado pelo trabalho já realizado na companhia.
Orientado pelo mesmo direcionamento estratégico, a usina oficializou uma parceria com a Corteva Agriscience e o Itaú BBA para constituição do Cubo Agro, uma iniciativa inédita com parceiros para criar o maior hub da América Latina no Agro. O objetivo é fomentar o desenvolvimento tecnológico de startups no agronegócio.
O principal direcionamento foi estruturar uma área para buscar gerar valor a partir de novos negócios, com olhar para soluções e oportunidades não apenas para seus processos e operações, mas além de suas fronteiras. Partindo de inovações e melhorias incrementais e graduais nos produtos, processos e serviços existentes, o principal objetivo é a exploração, com tecnologia, proposição de novos modelos de negócios, inovações que transformam segmentos e criam novas indústrias.
Leia também: Aprenda a diferença de invenção e inovação incremental, radical e disruptiva com exemplos de fácil compreensão
Nesse sentido, alinhado ao seu Planejamento Estratégico, a São Martinho reforça e potencializa a orientação para inovação, e por meio de iniciativas externas e internas visa capitanear projetos de inovação aberta, com alto potencial de desenvolvimento tecnológico por meio de parcerias, que tenham perfil inovador e que, concomitantemente, sejam prioritários para suas operações Agrícola e Industrial.
Em uma das ações de inovação, a São Martinho buscou disseminar conhecimentos sobre o tema pela empresa sobre indústria 4.0, tema essencial para a transformação do negócio. Nós da Haze Shift co-facilitamos este projeto com a co-criação de uma estratégia capaz de tornar seus próprios colaboradores disseminadores de conhecimentos. Isso foi feito de forma híbrida, por meio de encontros online e um Workshop Indústria 4.0.
Saiba mais sobre o Workshop Indústria 4.0 na São Martinho
Ações de inovação que auxiliam a resolver o Dilema da Inovação
A cultura de uma organização pode levar anos, quiçá gerações, para ser transformada. Portanto, iniciativas que auxiliem a acelerar este processo serão sempre bem vindas, claro, desde que bem planejadas e executadas por profissionais preparados. Pensando nisso, elencamos cinco ações que podem potencializar o ambiente organizacional e influenciá-lo para se estabelecer uma nova cultura de inovação:
- Desenvolver a visão dos colaboradores para a exploração de desafios tecnológicos e de inovação em seus processos
- Formar um time interno de facilitadores da inovação, os quais terão o papel de disseminar e serem os guardiões de conceitos ligados à inovação
- Criar fóruns propícios para apoiar a abordagem estratégica, com vistas a identificar oportunidades de projetos para inovação, os quais podem ser fomentados inclusive dentro de eventos que já existem dentro da empresa
- Com o avanço da maturidade no “item 1”, partir para buscas de desafios que vão além da melhoria contínua e que extrapolam a visão dos projetos atuais da empresa, que exijam uma abordagem mais radical ou disruptiva, tais como: tecnologia a ser adquirida, soluções e desenvolvimento de novas tecnologias ainda não disponíveis no mercado. Para isso, como forma de incentivar as pessoas e ao menos considerar todas as ideias, é interessante criar classificações para os desafios levantados, sugiro um mais à frente, que é vinculado ao Cynefin.
- Criar um pipeline de inovação para os desafios mais relevantes identificados, estabelecer processos de inovação aberta e buscar parcerias com vistas a soluções tecnológicas radicais para os negócios atuais e disruptivas, com vistas a antecipar negócios, seja por meio de novas fontes de receita, M&A, desenvolvimento e/ou investimento em Startups e/ou por meio de acesso à novos negócios
Vencendo o Dilema de Inovação: Como começar?
Comece pelo clima. A cultura de uma empresa pode levar gerações para ser alterada, de acordo com um estudo de 2019 da Garther. Portanto, se você quer influenciar a cultura de uma empresa, comece pelo clima, que ele impactará a cultura. Mas o que é o clima e o que é cultura de uma empresa?
Clima
O Clima de Inovação representa as percepções compartilhadas dos colaboradores de uma organização sobre a inovação, ou seja, como eles percebem a inovação. É a parte do iceberg que vemos acima da superfície.
Nesse sentido, o Clima de Inovação representa as percepções de um grupo de colaboradores (por exemplo, um departamento, uma unidade de negócios, uma organização inteira) com base em suas experiências de como seu grupo valoriza, discute ou gerencia a inovação.
Essas percepções são moldadas pelos eventos, políticas e procedimentos que os membros de um grupo vivenciam e pelos comportamentos que veem sendo encorajados, tolerados ou punidos.
Dessa forma, se faz necessário definir o que é cultura de inovação para a organização, aquilo que é estratégico e qual a ambição da empresa, visto que a cultura sofre forte influência de percepções. Assim como a figura dos cegos e o elefante, cada um possui seu entendimento de acordo com suas experiências, crenças e anseios. Só estabelecendo um ponto comum a organização poderá criar estratégias para melhorá-la.
Cultura da Inovação
Já a cultura de inovação são as suposições, crenças e valores profundamente arraigados com relação à inovação, compartilhados pelos colaboradores de uma organização. A cultura da inovação é como a parte submersa de um iceberg. É incrivelmente difícil de observar. Ela evolui lentamente e por longos períodos de tempo. E é muito difícil influenciar e mudar.
Saiba mais sobre o significado da cultura da inovação em um mercado acelerado
Por que as empresas devem se concentrar no clima vs. cultura?
Em comparação com a Cultura de Inovação, o Clima de Inovação é muito mais fácil de observar, medir e influenciar. Em um esforço para afetar a Cultura de Inovação de uma organização de uma forma significativa, mudar o Clima de Inovação é o lugar natural para começar.
Portanto, uma boa dica é compreender a diferença entre Cultura de Inovação e Clima de Inovação para concentrar seus esforços de forma mais mensurável.
Estruturar o clima de inovação de uma empresa permite que outros indivíduos, além do pessoal de inovação, atuem como protagonistas. De acordo com uma pesquisa da ACE (2020), 69% das proposições de inovação são de fontes internas à organização.
Assim constituímos um verdadeiro batalhão, orientado não apenas para a excelência na operação, mas também em prol de desafios de inovação. Ou seja, dessa forma, será possível propiciar um ambiente aberto e colaborativo, em que toda a organização passa a ser uma fonte interna inesgotável e cada vez mais apurada de oportunidades para a inovação.
Desafios para inovação: nós podemos apoiar
Geralmente, tendemos a querer resolver problemas logo no ato e assim voltamos ao título do texto Performar ou inovar?, a resposta já demos, é o equilíbrio. Porém, para a inovação ter vez frente a pauta já bem estabelecida da rotina, precisamos falar de questões relacionadas à Cultura da organização.
O fator primordial para potencializar resultados em inovação passa por desenvolver uma forte cultura orientada para o tema. Embora medir e melhorar a cultura de inovação possa parecer uma tarefa desafiadora (com bons motivos), o primeiro passo precisa ser dado.
Porém, é importante lembrar: a abordagem deve ser taylor made, ou seja personalizada, de acordo com o momento e as estratégias de inovação da organização. E para isso é importante contar com uma consultoria especializada em construir uma estratégia inovadora, capaz de diferenciar o clima e a cultura da inovação da sua empresa.
Por isso, fica o convite: entre em contato conosco na Haze Shift e vamos, juntos, visualizar o iceberg da sua organização por completo e identificar as oportunidades de inovação em toda cadeia produtiva do seu negócio.
Escrito por:
Jonathan Mendes
Profissional com mais de 17 anos de mercado, tendo atuado nos últimos 7 anos no Agronegócio como coordenador corporativo para gestão da inovação e estratégia, estruturação de sistemas de gestão da qualidade e melhoria de processos. Foi executivo de expansão em uma startup de Inteligência Empresarial. Atuou como Gerente de Qualidade Assegurada na indústria de bebidas e possui vasta experiência na agroindústria, tendo atuado tanto no processo produtivo, quanto em setores de garantia da qualidade. Foi sócio administrador em uma empresa no ramo de prestação de serviços, participou de imersões em ambientes inovadores no Brasil, Estados Unidos e Portugal. É idealizador do Canal Vidas Empreendedoras, atua como mentor e investidor anjo de startups, professor e consultor em estratégia, processos e inovação.
Deixar um comentário