Assim como a manufatura passou por uma transformação na década de 1990, o mesmo ocorre com a inovação hoje. Os arquitetos de inovação têm muito a aprender com os métodos de manufatura enxuta, ou lean manufacturing: desperdícios são evidenciados pela metodologia. 

Ao estudar como a manufatura enxuta trouxe mudanças para uma nova mudança de paradigma em escala, trazendo eficiência e criando um ótimo ambiente de trabalho para os colaboradores, podemos fazer o mesmo pela inovação.

A palavra ‘Lean’ vem da Manufatura Enxuta, que se concentra na redução do desperdício de tempo e recursos. Podemos aplicar a mesma filosofia ao processo de inovação, agilizando o fluxo de ideias e removendo as vendas e bloqueadores do processo. O pensamento de design ajuda as organizações a serem enxutas, eliminando incógnitas e reduzindo riscos e desperdícios por meio de pesquisas contínuas e descobertas de clientes.

Leia mais sobre a metodologia em nosso resumo do livro Startup Enxuta; aproveite e ouça o podcast 

Pensando de forma comparativa, enquanto a manufatura trata do gerenciamento do fluxo de matérias-primas para a produção em massa e personalização de produtos, a inovação trata de gerenciar o fluxo de ideias para criar, por exemplo, uma nova oferta robusta e aderente ao mercado.

As organizações têm tentado trazer inovação e dimensionar essa capacidade por mais de uma década. Eu vejo como mais desafiador para uma organização de legado tentar casar o desempenho da inovação com a eficiência operacional para reduzir o custo transacional de ser consistentemente inovadora. Portanto, ampliar a inovação, muitas vezes, é uma necessidade urgente.

Lean manufacturing: desperdícios 

Mesmo sendo a inovação uma necessidade urgente, podem existir algumas armadilhas que precisamos aprender a evitar. Portanto, vamos entender e nos concentrar no conceito de eliminação de desperdícios da manufatura enxuta, também conhecido como Muda (uma palavra japonesa que significa inutilidade ou desperdício), e aplicar isso à inovação. Confira a seguir a comparação dos sete desperdícios de lean manufacturing no Muda com os desperdícios de inovação no trabalho moderno: 

“A adoção da metodologia enxuta no fluxo de inovação capacita as equipes de inovação a mapear suas ideias em todo o espectro organizacional e economizar tempo, energia e recursos monetários.”

Vejamos por que esses desperdícios acontecem em uma organização e quais estratégias podem ser adotadas para adotar uma estratégia eficaz. Veja: 

1. Overproduction (superprodução)

Na manufatura, a superprodução envolve a produção de produtos além do que o cliente solicitou. Na inovação, a superprodução de ideias pode agregar  pouco valor ao cliente ou à empresa. Entenda por que isso pode acontecer: 

– Foco em prioridades erradas, o que leva à superprodução.

– Falta de alinhamento.

– Excesso de ideação e excesso de documentação, mais do que o necessário.

– Ausência de disposição para eliminar ideias sem valor.

E qual estratégia poderia ser usada? Vejamos algumas: 

– Em primeiro lugar, reconhecer que a superprodução ocorre e quais são as verdadeiras prioridades .

– É importante alinhar o portfólio de ideias de inovação à estratégia de crescimento do negócio.

– Mapear iniciativas e priorizar projetos com base no valor do cliente, e não nos interesses da equipe.

– Eliminar ou interromper projetos que não estejam criando valor para o cliente.

2. Excess Inventory (Excesso de estoque)

Na manufatura, o excesso de estoque se refere ao trabalho em andamento (WIP). Nesse caso, o excesso de estoque de produtos acabados e matérias-primas que uma empresa possui.

Na inovação, o excesso de estoque também pode se referir ao trabalho em andamento (WIP). Ou seja, excesso de estoque de ideias, relatórios de pesquisa não utilizados ou subutilizados, materiais, amostras e protótipos.

Como isso poderia acontecer?

– Por falta de visibilidade de todo o processo de inovação

– Devido ao planejamento insuficiente do pipeline de projetos e do fluxo de projetos à medida que passam de uma fase para a seguinte.

– Desequilíbrio no pool de talentos. Isso significa que pode haver muitos criadores de ideias e poucos implementadores, ou seja, muitos pensadores e poucos realizadores.

– Sistemas de arquivamento e armazenamento deficientes causam dificuldade em rastrear ideias e informações relevantes.

Qual estratégia poderia ser usada?

– Mapeamento visual de todos os projetos de inovação ao longo de um fluxo de processo para garantir transições suaves.

– Divisão de grandes projetos em pedaços menores para obter melhor visibilidade, o que permite um planejamento preciso e uma entrega mais rápida.

– Equilíbrio da estrutura da equipe para garantir que o número certo de habilidades e atitudes específicas estejam presentes.

– Aumento de equipes com consultores externos, quando necessário, para garantir o andamento adequado dos projetos.

3. Waiting (Espera)

Na manufatura, espera é o ato de esperar que uma máquina termine, chegue um produto ou qualquer outra causa. Já em inovação, a espera representa o atraso gerado por falta de insumos, revisões por pares, decisões de financiamento, aprovações decorrentes de burocracia, fiscalizações, mecanismos de feedback ou aprovação.

Como isso pode acontecer?

– Pela falta de comunicação e conhecimento perdido na mudança de pessoas de área e turnover (quando pessoas deixam a empresa).  

– Resposta inoportuna e atrasada devido à limitada participação mental e à escassez de recursos.

– Reuniões desnecessárias e processos de aprovação hierárquica.

– Indisponibilidade de locais certos para realizar o trabalho e/ou padrões e protocolos para transferência de conhecimento.

Quais estratégias podem ser usadas?

– Implantar plataformas que funcionem como fontes únicas de informação / conhecimento.

– Habilitar métodos assíncronos de comunicação entre as equipes para otimizar o fluxo.

– Promoção de uma cultura de acessibilidade e transparência entre colaboradores e líderes para permitir uma aprovação e tomada de decisão rápidas.

– Fornecimento de uma variedade de locais de trabalho para reuniões e sessões de inovação de todos os tamanhos.

4. Motion (movimento)

Na fabricação, o movimento se refere ao movimento físico de uma pessoa ou máquina durante a realização de uma operação.

Em inovação, movimento se refere ao movimento físico de uma pessoa necessário para acessar quadros, laboratórios ou protótipos armazenados durante um experimento ou ciclo de exploração. 

Como isso pode acontecer?

– Indefinição do tipo certo (tamanho, localização, ferramentas) para a inovação.

– Foco em fazer as coisas sem prestar atenção nas lacunas e ineficiências de fluxo.

– Membros de equipe distribuídos ou operações isoladas que impedem o avanço de ideias.

– Tempo excessivo para encontrar a pessoa certa para colaborar.

– Falta de acesso aos fornecedores ou softwares certos para atividades de inovação.

Quais estratégias podem ser usadas?

– Fornecimento de acesso fácil às pessoas, áreas de trabalho, recursos, informações, ferramentas e artefatos como e quando necessário.

– Evite procurar suas próprias ineficiências. Incentive avaliações externas de ineficiências.

– Quebra dos silos organizacionais, para fazer as equipes funcionarem bem juntas

– Forneça resultados aos clientes internos conforme eles precisam – planeje resultados mais curtos.

5. Transportation (Transporte)

Na manufatura, o transporte é a movimentação de produtos entre as operações e locais. Pode envolver componentes brutos, subconjuntos, caixas vazias ou qualquer coisa necessária para a produção. O transporte de material é uma atividade necessária, mas não agrega valor ao produto final.

Em inovação, transporte pode ser  o movimento do conceito ou ideia entre disciplinas ou grupos ou de uma fase para a seguinte. Embora não agregue valor ao produto final, é fundamental para a adesão das partes interessadas da organização.

Como isso pode acontecer?

– Falta de uma história ou proposta boa e convincente.

– Documentação inadequada da intenção do conceito original. Apenas a ideia é comunicada sem a pesquisa original que informou as ideias.

– Comunicação e gestão inadequadas do fluxo entre os grupos.

– Incompatibilidade entre diferentes sistemas e plataformas levando à perda de informações na transferência.

Quais estratégias podem ser usadas?

– Desenvolver modelos de comunicação que contenham a pesquisa, ideia e história como uma unidade.

– Investir em documentação sistemática e boa narrativa do conceito ou ideia.

– Avaliar o movimento desta unidade em todas as fases do processo – exploração, desenvolvimento, cadeia de abastecimento e entrega.

– Investir em um design de processo e ferramentas de software para permitir um fluxo de informações.

– Considerar a  reorganização do seu negócio internamente (até arranjos internos) com base no estreitamento do fluxo de ideias.

6. Defects (Defeitos)

Na fabricação, os defeitos são produtos rejeitados ou que não atendem às expectativas do cliente. Frequentemente, isso leva ao retrabalho dos processos de fabricação.

Na inovação, defeitos podem ser as ideias que são rejeitadas, conceitos que não são enviados ou atendem aos requisitos e satisfação do cliente quando enviados. Um defeito pode surgir em qualquer aspecto da oferta – produto, serviço, vendas, marketing, envolvimento do cliente.

Como isso pode acontecer?

– Construir a solução muito cedo sem entender as necessidades do cliente.

– Falta de compreensão das habilidades e restrições da equipe de engenharia ou execução.

– Ausência de uma cultura que capacite e inspire confiança nos colaboradores para destacar os problemas e resolvê-los.

– Equipes de inovação muito envolvidas em uma solução única, em vez de buscar maneiras inovadoras de resolver o problema.

– Relatórios deficientes e uma falta geral de controle de qualidade em todo o fluxo de trabalho de inovação.

Quais estratégias podem ser usadas?

– Investir em pesquisas e testes iniciais. Compreenda as necessidades e aspirações do cliente.

– Conversar com as partes interessadas internas e externas para aprender sobre suas habilidades e limitações.

– Definir claramente a responsabilidade, as métricas de inovação e os sistemas de recompensa pela inovação em cada estágio.

– Estabelecer interesse em pivotar ou mesmo encerrar uma iniciativa com base nas descobertas da pesquisa.

– Implantar protocolos de gerenciamento adequados ao implementar uma solução.

– Ações de inovação aberta e design estratégico e thinking, por exemplo

7. Over processing (Processamento excessivo)

Na manufatura, o superprocessamento descreve operações além daquelas que o processo ou cliente exige.

Na inovação, o superprocessamento pode estar descrevendo atividades desnecessárias, variações de escopo dos stakeholders, desalinhamentos devido à comunicação deficiente e excesso de trabalho em conceitos.

Como isso pode acontecer?

– Aumento do escopo que leva à falta de foco no problema real ou no problema do cliente.

– Ruídos de comunicação durante a transferência de projetos.

– Duplicação de atividades e necessidade excessiva de relatórios.

– Falta de responsabilidade e KPI’s claramente articulados para os integrantes da equipe de inovação.

Quais estratégias podem ser usadas?

– Considere se cada atividade é ou não realmente necessária.

– Avalie se a ação agrega valor ao processo e ao resultado.

– Teste e crie protótipos de métodos regularmente para melhorar o fluxo e reduzir gargalos.

Pensando além dos desperdícios apontados pela lean manufacturing

Agora que já vimos, por meio da metodologia lean manufacturing, desperdícios e possíveis soluções, também é importante considerar alguns fatores essenciais para potencializar a inovação mitigando riscos. 

Por exemplo, sabemos que um processo de fabricação está focado na produção perfeita, ou seja, zero defeitos (alta qualidade), baixo custo de operação e transporte, segurança para os colaboradores, entrega no tempo correto de seus produtos, entre outros. Como pudemos observar, a principal diferença entre manufatura e inovação está no próprio processo. E para mitigar desperdícios posteriores, a inovação fica melhor ao falhar e testar os primeiros protótipos, eliminando riscos posteriores, uma vez que a prototipagem ajuda a enxergar problemas. 

Nesse sentido, é por isso que as organizações que são líderes em manufatura enxuta e Seis Sigma (ou Six Sigma, em inglês) frequentemente lutam para ser líderes em inovação. Mas nem por isso precisamos adotar 100% dos princípios da manufatura enxuta para a inovação. Porém, em vez disso, podemos aprender com a metodologia Lean e adaptar à realidade inovadora de cada organização. 

Pegar emprestado a lente da eliminação de desperdícios (Muda) do Lean, por exemplo, nos permite treinar para eliminar o desperdício de nossos processos de inovação. Aprender com essas imperfeições e eliminar esse desperdício ajuda a ideia a fluir melhor para o próximo estágio.

Além disso, ter visibilidade de todo o processo de inovação é essencial antes de identificar tais questões. O uso de métodos de design centrados no ser humano pode ajudar a construir protocolos de inovação, mapear o fluxo de ideias e ajudar a movimentar ideias entre os vários stakeholders (internos e externos).

Por fim, fica o convite para conversarmos. Nós da Haze Shift estamos prontos para colaborar com sua empresa, utilizando  aprendizado de várias metodologias e experiências que, comprovadamente, ajudam organizações a otimizar seus esforços de inovação com uma abordagem enxuta e ágil. Se tiver alguma dúvida, escreva ou, simplesmente, deixe um comentário. Teremos prazer em responder e ampliar esse debate. 

Escrito por:

Junior Chapim
Junior Chapim
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Junior Chapim é consultor associado da Haze Shift, engenheiro, profissional com 20 anos de experiência em indústrias multinacionais nas áreas de treinamento, Lean Manufacturing, planejamento estratégico e gestão de projetos. Atuou por 14 anos como líder de equipes fomentando o intraempreendedorismo nas organizações.