Nós da Haze Shift estamos acostumados a levar inovação às empresas, e durante essa vivência percebemos um elemento que faz parte de um movimento importante para projetos inovadores terem melhores resultados: a organização escavar qual é o seu propósito.

Nesse quesito, a dupla de autores brasileiros Cecília e Jaime Troiano, duas autoridades globais de branding, produziram uma obra-prima que eu sugiro ser leitura de cabeceira para todos os executivos e empreendedores. O livro Qual é o seu propósito, cujo resumo trazemos neste texto e em nosso Podcast Haziliente, com a minha participação e também do host Luiz Henrique e dos colaboradores Anamaria Oliveira, Daniela Mazzoni, Matheus Carvalho, Renan Strapazon e Roberta Bernini.

Eu, por exemplo, cheguei à essa leitura por recomendação da Anamaria Oliveira, nossa especialista de branding que também colaborou na produção desse artigo. Ao revisitar os projetos que nós da Haze Shift fizemos, vemos que organizações que têm a cultura da inovação mais enraizada têm cada vez mais claro o seu propósito. São, aliás, corporações que têm colaboradores com propósitos pessoais que, em grande parte das vezes, refletem o local de trabalho. É por isso que o livro é tão rico: vale para pessoas e organizações.

Elas vêm enxergando a importância do propósito não apenas por uma questão de marketing ou por se uma palavra que está se popularizando no meio corporativo, mas porque ele também ajuda a explicar o porquê da empresa fazer o que faz, demostrando sua conexão profunda com o consumidor. Isso envolve a participação de todos os stakeholders, em especial para colaboradores que passam a perceber que trabalham para uma companhia que realmente tem  algo especial a oferecer à sociedade.

Qual é o propósito das empresas, afinal?

É diferente da missão, visão e valores corporativos, posicionamento, que podem mudar ao longo do tempo, ou causa, que pode ser um desdobramento a partir do propósito. Como ensina Jaime Troiano, o propósito é a razão de existir da organização ou da pessoa, vem do encontro dos talentos da organização com as necessidades do mundo.

Além disso, quando uma empresa nasce, a fundação acontece por diferentes razões. Esse início pode ser de uma necessidade de mercado, por paixão do fundador ou como uma solução inovadora. E as histórias das empresas são histórias de pessoas. É por isso que é importante saber qual é o seu propósito: o livro faz muito bem essa pontuação.

No fim do dia, essa intersecção pessoal e corporativa:

  • Ajuda a alinhar comunicação interna e externa;
  •  Colabora para reter talentos;
  •  Faz a companhia ter clientes mais estáveis, identificados com a marca, ou seja, com o negócio.

Escavação do propósito

Perceba uma coisa. Os três itens acima são quase que um mundo ideal em empresas de qualquer porte. Para chegar nesse mundo ideal, as pessoas precisam entender as empresas. Nesse sentido, escavar qual é o seu propósito corporativo é fundamental. Mas como fazer isso?

Além de revisitar a história da organização, stakeholders internos e externos precisam ser ouvidos. Afinal, você precisa conhecer o nível de identificação das pessoas que interagem com sua marca e que fazem parte de sua companhia. Isso pode e deve ser feito de forma colaborativa. Uma maneira é a co-criação com ensinamentos do design estratégico e da cultura de inovação, como mostramos no seguinte artigo:

Entenda como fazemos a inovação no planejamento estratégico por meio da cocriação feita por pessoas para pessoas

Muitos dos ensinamentos de Cecilia e Jaime Troiano acabam fazendo certa conexão com os de outros autores internacionais. O conceito de mundo VUCA, por exemplo, elaborado por Eric McNutty, identifica um universo de Volatilidade, Incertezas (Uncertainty), Complexidade e Ambiguidade presente na sociedade e nos negócios.

Eu vejo no livro de Troiano a necessidade de mitigar a complexidade da empresa e tomar decisões chave. Já por meio do conhecimento da volatilidade, conseguimos enxergar a capacidade da empresa de reagir a mudanças.

Ademais, a partir da volatilidade, podemos questionar: “Como essa organização reagiu a ambientes de incertezas, como a pandemia? Foram ágeis o suficiente para se adaptar a questões como ao trabalho remoto?”  E ambientes complexos geram muitas vezes várias interpretações, culminando na ambiguidade. Por isso é tão importante identificar como uma organização apoia na resolução das necessidades do mundo e da sociedade, nos ajuda a identificar o propósito da empresa, que é o núcleo imutável de uma empresa em meio a tanta volatilidade.

A pergunta qual é seu propósito e a resposta de uma empresa de saneamento

Um case muito interessante abordado no livro tem a ver com Meio Ambiente e Sociedade, ou seja, as letras E e S da sigla ESG, hoje tão em voga e que significa Environmental, Social and Governance. Em um trabalho com a Aegea, uma das maiores empresas de saneamento do segmento privado no país, Troiano percebeu que os colaboradores, em grande parte engenheiros, tinham alto conhecimento de suas entregas tangíveis, ou seja, oferecer água potável e saneamento aos clientes.  

Mas e quanto ao intangível? Em seu trabalho com a empresa, ficou claro para Troiano que a entrega da Aegea ia mais além.

A companhia leva bem-estar e saúde a diferentes comunidades pela água potável. A empresa colabora de forma ambientalmente responsável e preço justo com o propósito de levar às pessoas o que elas precisam: água limpa e saneamento básico, algo essencial para uma vida digna e com oportunidades, mitigando doenças e reduzindo, assim, o impacto sobre o sistema público de saúde.

Leia também: Empresas de qualquer ramo podem ser fontes de energia limpa e água potável. Duvida? Nós explicamos

Em outras palavras, a Aegea colabora com as necessidades do mundo, e fortemente com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, que temos uma série de artigos neste link.

Essa ampla identificação e escavação de propósito levou a algumas mudanças na empresa. A primeira foi na marca gráfica (logo), que trouxe movimentos de rio e fluidez, com as cores azul e verde, remetendo à natureza e água limpa. A logo e o propósito foram comunicados aos colaboradores tendo ampla aceitação e receptividade, mudando a visão interna das equipes sobre seu próprio trabalho.

Rota do Soul

Outro ensinamento do livro é A Rota do Soul, uma analogia às palavras “sou” com “soul” (alma em inglês) e “sol”. Esse nome é uma criação do próprio autor para conectar o propósito organizacional às necessidades do mundo contemporâneo, promovendo ações com stakeholders.

A rota faz uso do conceito de Golden Circle, criado pelo autor Simon Sinet, que determina três perguntas às empresas: o que é o produto ou serviço e diferencial; como faz, ou seja, como são realizados os aspectos operacionais de sua atividade; e por que a organização faz o que faz, ou seja, seu propósito. Nesse sentido, a metodologia Rota do Soul tem três fases:

  • Primeira – SOU: Aborda a escavação das origens da empresa, realiza o mapeamento de talentos e das vocações da empresa ao longo do tempo e faz o que Troiano chama de Encontro com o Mundo, onde faz o cruzamento dos talentos com as necessidades da sociedade.
  • Segunda – SOUL: na revelação da empresa, após identificado e lapidado, o propósito é resumido em uma frase síntese que expressa os talentos da marca. Aqui também entra o manifesto para disseminação do propósito.
  • Terceira – SOL: onde acontece a disseminação do propósito com ações efetivas para iluminar stakeholders, além de identificar embaixadores da marca (como  colaboradores com maior afinidade ao  propósito) promovendo treinamentos e a elaboração de um vídeo que materializa o propósito da marca, servindo de engajamento.

Super interessante e inovador, não? Então vamos ver um exemplo prático.  

Qual é Seu Propósito: resumo do melhor caso do livro na minha visão

Certamente você já ouviu falar na Riachuelo, companhia de vestuário para o varejo do Grupo Guararapes, que tem mais de 40 mil colaboradores. Pois bem, a Riachuelo tem em sua organização uma diversidade imensa de pessoas. De costureiras a vendedores, de gerentes de loja e logística a executivos.

Com mais de 65 anos de história, um grande desafio de uma gigante do varejo é fazer com que o propósito seja revelado e disseminado. No livro Qual é seu propósito, Jaime Troiano conta que buscou entender tanto a percepção dos colaboradores recém-chegados quanto dos mais antigos (da primeira geração trabalhando) sobre a empresa.  

Mais de 200 colaboradores foram ouvidos um a um, e coincidiam em um fator: a admiração pelo fundador, Nevaldo Rocha, que começou a história da Riachuelo com uma pequena loja de tecidos em Natal (RN). Eles reconheciam na figura de Nevaldo o esforço de um líder batalhador e que buscava a inclusão, dando oportunidades para pessoas de diferentes níveis sociais. É o E de ESG na prática!

Entenda: Qual é a relação entre ESG e inovação e como acelerar a aderência a essas 3 letras

Nessa escavação, ficou claro que o propósito da Riachuelo sempre foi incluir pessoas por meio da moda. E o propósito da companhia, que já estava lá presente no dia a dia e na alma (soul) da corporação, ganhou um nome: O abraço da moda.

Isso foi comunicado internamente, por ações e campanhas, mostrando que a empresa é capaz de oferecer o primeiro emprego, o acesso a vestuário para todos e a expressão pessoal por meio da moda. Para fora da companhia, O abraço da moda também ficou claro pela questão da inclusão por meio da moda e por um preço acessível

As costureiras, por exemplo, ganharam vitrines onde podiam ver e admirar os produtos finais que elas mesmas produziam. O resultado foi nítido e comprovado por números: redução de acidentes de trabalho, menor turnover (rotatividade), menor número de processos trabalhistas e maior satisfação dos colaboradores, identificada por pesquisas de clima.

Caminho da inovação

Para encerrar este texto, eu acho importante destacar que a identificação do propósito de uma empresa é uma grande porta que se abre para a inovação.

Empresas que conhecem sua própria existência no mundo e que têm propósitos claros comunicados para o mercado tendem a ser mais inovadoras, sem dúvidas. Aliás, elas tendem a ser mais ágeis e a se adaptarem para as eras de transformação. Isso facilita o desenvolvimento e execução de projetos e programas de inovação aberta, por poder mostrar a possíveis parceiros sua conexão com os problemas do mundo. Facilita também a identificação de colaboradores com a empresa e projetos de cocriação de planejamento estratégico, por exemplo.  

Tudo isso tem consequências inegáveis e muito esperadas pelos empresários: gera valor para acionistas e valoriza a própria marca da empresa no mercado. 

Fica aqui meu convite. Após escavar seu propósito, as portas da inovação poderão estar sempre abertas para sua empresa e juntos podemos desenvolver a sua cultura da inovação e desbravar  caminhos para as rotas de inovação para o seu negócio.

Escrito por:

Digital Transformation Leader & Co-Founder de Haze Shift | + posts

Certified facilitator of LEGO® SERIOUS PLAY® & Digital Transformation Enabler with a demonstrated history of working in the information technology and food & beverages industry.

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