Sempre que alguém fala em diversidade parece obrigatório pensar na importância da inclusão relativa a gênero, cor, idade, pessoas com deficiência. E, sim, isso é muito importante. Só que diversidade é muito mais do que isso, como vamos mostrar neste resumo do livro Ideias Rebeldes, de Matthew Syed, lançado em 2019.

Essa obra mostra como, muitas vezes, as empresas – devido a seus sistemas de recrutamento – acabam recrutando pessoas muito semelhantes, o que o autor chama de clones. Ou seja, inconscientemente, as organizações recrutam profissionais com pouca diversidade de pensamento e seguem vivendo em bolhas, o que o livro chama de Câmaras de Eco. Isso impacta diretamente na inovação, como veremos a seguir.

Poucas vezes em minha carreira como consultor de inovação eu vi um livro virar referência tão rapidamente em nossa área. Isso inclui também nós da Haze Shift, pois faz parte da lista de leituras do nosso time sobre diversidade e inovação. É tão relevante que acabamos de resolver compilar alguns ensinamentos da obra no Podcast Haziliente. Ouça agora:  

Nesse podcast estiveram eu (Marcos), meu sócio Luiz Fernando Frederico, e nossos colaboradores Anamaria Oliveira (da área de Marketing), a Anna Flávia Alcântara e o Pedro Santoro (ambos do time de Operações), o host do programa Luiz Henrique Costa, e um convidado especial, o Matheus Iensen, diretor de gestão de pessoas da empresa júnior do curso de Engenharia da UTFPR de Ponta Grossa.

Ideias Rebeldes: livro, resumo e inovação

Além do podcast, nós complementamos o debate com informações em nosso blog. Aqui neste post fazemos um resumo do livro Ideias Rebeldes: apresentamos como a publicação traz relações diretas ao trabalho com o trabalho de empresas que valorizam diversidade e inovação.

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Logo de cara, Matthew Syed traz um ótimo exemplo de como a diversidade de pensamento poderia ter mudado o curso da história, mais especificamente o atentado do 11 de Setembro, quando dois aviões derrubaram as Torres Gêmeas de Nova York e outro atingiu o Pentágono.

O autor insere uma série de informações indicando que os Estados Unidos tinham conhecimento de suspeitos que faziam aulas de aviação em solo norte-americano. Ele relata o caso de um detido para depoimento antes dos atentados, que foi liberado. Ou seja, a CIA estava tão fechada em suas próprias informações que demorou para agir.

O organizador de tudo, Bin Laden, já era conhecido e mapeado pela CIA. O grande problema era que as pessoas que analisavam o comportamento dele e de sua organização terrorista, a Al Qaeda, não sabiam quando eles iriam agir. Até mesmo pareciam considerar Bin Laden um bocado primitivo. Por quê?

A explicação do autor tem a ver com o modelo de recrutamento da CIA, que seguia os mesmos moldes desde os anos 1950, resultando na contratação de cabeças parecidas: homens brancos, americano médio, basicamente saídos de três ou quatro universidades. A provocação neste sentido é que se tivessem pessoas na equipe com sensibilidade à cultura islâmica, talvez um imigrante, formado de acordo com as necessidades técnicas da CIA, a história poderia ser diferente.

Agora, responda: sua empresa é formada por clones?

O exemplo acima deixa bem claro os riscos de estar sempre buscando pessoas parecidas para preencher vagas. Por isso eu faço uma pergunta: como é o recrutamento em sua empresa? Vocês buscam pessoas sempre com a mesma formação, dão preferências a formados ou estagiários das mesmas universidades ou valorizam a diversidade cognitiva?

Ou seja, como diz o autor do livro Ideias Rebeldes, você estaria buscando clones. E clones são sujeitos que tendem a repetir erros.

O problema aqui é o seguinte…

Se todos nós nos formarmos em um mesmo lugar, teremos mais propensão a cometermos as falhas pelo simples fato de não termos sido ensinados a pensar diferente. Isso também se aplica quando buscamos pessoas com o mesmo perfil como, por exemplo, as empresas que buscam recrutar somente executivos que trabalharam em multinacionais, em detrimento daqueles que, por exemplo, já foram empreendedores e agora estão na carreira executiva.

De uma coisa eu tenho certeza: o simples fato de trazer pessoas diferentes ao time pode fazer toda a diferença. E o livro Ideias Rebeldes mostra isso na prática no capítulo: Clones versus Rebeldes. O autor dá um exemplo interessante, da seleção de futebol da Inglaterra.

Se você não acompanha futebol, vou explicar rapidamente um fato: o país tem um dos melhores campeonatos do mundo na modalidade, a Premier League, e uma seleção que sempre (sempre mesmo) entra como candidata a vencer competições. Mas o último grande título foi a Copa do Mundo de 1966.

Especialistas passaram a refletir se aquilo era um bloqueio mental, e a maioria concordava que a Inglaterra tinha dificuldades em partidas decisivas e em cobranças de pênaltis (foi eliminada na Copa de 1990, 1998 e 2006 e na Eurocopa de 1996, 2004 e 2012). A seleção inglesa era campeã de derrotas nos pênaltis!

E então, o que fazer?

Foi quando a diretoria da Associação de Futebol Inglesa de futebol decidiu mudar o grupo: não de jogadores, mas o conselho geral.

Ao invés de chamar sempre as mesmas pessoas, especialistas em futebol (ou seja, clones), em 2016 chamaram conselheiros de outros esportes e outras especialidades (como psicologia e o próprio Matthew Syed) para mudar a diversidade cognitiva por trás da seleção para compartilharem o que o autor chama de ideias rebeldes: o autor Matthew Syed compartilhou um pouco dos resultados e o significado disso em um trecho do livro. Confira:

Grupos diversificados expressam propriedades radicalmente diferentes. Foi fascinante ver como as pessoas que não eram especialistas em futebol perceberam algumas das fraquezas subjacentes nos métodos da seleção e treinamento, de levar uma nova perspectiva para as reações com a mídia do preparo para uma disputa de pênaltis. As ideias rebeldes eram rejeitadas com frequência. As trocas eram férteis e quase sempre levavam a pensamentos divergentes e a soluções mais sofisticadas.

Ideias Rebeldes e a diversidade cognitiva

Olha, se por um lado até 2021 a seleção inglesa ainda não ganhou um título de expressão, ela melhorou muito seu desempenho em grandes campeonatos. Foi a 4ª colocada na Copa do Mundo de 2018 e vice da Eurocopa 2021 (ironicamente perdendo nos pênaltis para a Itália).

Eu, pessoalmente, diria que esse novo board ajudou o pessoal da seleção inglesa a hackear a Associação de Futebol Inglesa. Como expliquei neste outro artigo no Blog da Haze Shift, hackear uma organização é quebrar modelos e processos do passado, e construir o novo dando sentido às coisas. Significa tomar medidas intencionais para criar uma mudança cultural positiva dentro da organização, exatamente o que aconteceu com a seleção da Inglaterra.

Leia também: O que é culture hacking e como hackear a cultura de sua empresa

Qual lição você pode tirar disso para sua empresa?

Em primeiro lugar, fica evidente que o case da Inglaterra mostra um exemplo da co-criação de uma nova mentalidade, a partir de mentes diversas. Ou seja, pessoas pensando diferente trazem uma nova diversidade cognitiva, e podem melhorar a resolução de problemas.

Vou dar um exemplo. Nós da Haze Shift fizemos um projeto junto a um grande cliente do setor de caminhões, onde ajudamos a cocriar o planejamento estratégico da empresa na América Latina. Até então, eles recebiam o planejamento da matriz da Europa e tinham de replicar. E isso gerava alguns problemas, afinal, a realidade latina é muito diferente da europeia. 

De forma inédita na companhia, nós ouvimos mais de 250 pessoas, de diferentes áreas da empresa, do board ao chão de fábrica, e auxiliamos nessa cocriação do planejamento. Podemos dizer que uma comunidade de pessoas inquietas dentro da empresa nos ajudou a hackear a empresa para melhorar a visão estratégica.

De certa forma, é mais ou menos o que aconteceu com a seleção inglesa, que antes fazia tudo com as mesmas pessoas, sem visões diferentes. Em nosso cliente, nós apostamos em novas cabeças para ampliar a diversidade cognitiva do planejamento estratégico. Desconstruímos um padrão de décadas para promover um planejamento que fazia mais sentido às atividades do grupo no continente latino-americano.

Dissidência Construtiva e Câmaras de Eco

Bom, além desses excelentes exemplos, o livro cita como, muitas vezes lideranças bem intencionadas, sem querer, podem provocar grandes problemas. Líderes em posição hierárquica superior, muitas vezes, podem tomar decisões erradas pelo simples fato de não ouvirem seu entorno, o que poderia ajudar a driblar um ambiente VUCA: volátil, incerto, complexo e ambíguo.

No livro Ideias Rebeldes, há dois exemplos de como isso aconteceu. No maior desastre do Everest até hoje, em 1996, dois guias/instrutores formados levaram uma equipe de experientes alpinistas até o topo. Na descida, vieram os problemas. Com uma tempestade fortíssima, os guias ficaram um bocado perdidos no que deveriam fazer. Tomaram as atitudes que acharam melhor (o que é aceitável, claro), mas culminou em oito mortes.

Até hoje, os sobreviventes relatam e criticam a liderança. Poderia ter sido feito algo diferente? Poderiam, em conjunto, terem tomado uma atitude diferente? É impossível dizer, mas é possível que isso seria uma dissidência construtiva, ou seja, uma divergência de opiniões que poderia ser mais produtiva (no caso em questão, evitando uma tragédia).

E há também ambientes que muitos subordinados com alto nível de conhecimento poderiam fazer a diferença, mas pelo fato de respeitarem uma hierarquia acabam se complicando. Em alguns casos, o problema pode ser fatal. O livro cita a equipe que compõe um voo, quando o comandante do avião tem a última palavra.  Certa vez, em 1974, um piloto da United Airlines desconfiou que o trem de pouso não estava abaixado para o pouso, apesar de os instrumentos afirmarem que estava tudo certo.

O que o piloto poderia fazer?

O comandante decidiu que era melhor o avião dar voltas no ar até ter a certeza de que tudo estaria seguro. Um engenheiro entrou na cabine e verificou que dois parafusos das asas estavam levantados, o que sinalizava que, provavelmente, o trem de pouso estava abaixado. Eles também contactaram o Centro de Controle, relataram o fato e receberam o conselho de que as rodas provavelmente estavam abaixadas.

Já o engenheiro percebeu que não haveria muito tempo para o avião ficar no ar, devido ao combustível, mas evitou se contrapor ao líder (piloto). Para o engenheiro e para o copiloto, seria melhor aterrissar. Ou seja, não foram rebeldes o suficiente para se opor. Resultado: o avião caiu, 20 das 200 pessoas morreram, mesmo com alguém com bons motivos para dissidência construtiva tomar a decisão.

Em casos assim, muitas vezes visto no mundo corporativo, fatores de dominação como status e prestígio acabam atrapalhando. Os líderes vivem no que o autor chama de Câmaras de Eco, que basicamente é a questão de viver em uma bolha de informação, ou seja, quando as pessoas consomem somente um tipo de conteúdo, por exemplo, sem diversificar seus conhecimentos. Isso gera alienação, e é mais ou menos como aquele ditado em que muita gente busca resultados diferentes fazendo as mesmas coisas. As equipes acabam perdendo atitudes em prol da inovação, como a de descobrir, testar e experimentar prototipando coisas diferentes

Sinto informar, mas isso simplesmente não vai acontecer. E um grande meio para sair desse mundinho de uma Câmara de Eco é a inovação aberta, onde os integrantes de uma empresa buscam atores internos e externos para gerar soluções. Nós da Haze Shift, por exemplo, somos especialistas em fazer essa conexão entre empresas e parceiros, e temos dezenas de casos que comprovam como conseguimos tirar lideranças de Câmaras de Eco para, junto com parceiros, encontrarem novos conhecimentos para solucionar problemas.

O resumo do livro ideias rebeldes, a inteligência coletiva, e a cultura da inovação   

Para finalizar este texto, eu faço algumas provocações a você. Com tudo o que aprendemos acima neste resumo do livro Ideias Rebeldes, responda sinceramente:

  • Sua organização busca realmente a diversidade cognitiva, trazendo melhores resultados, ou apenas tenta parecer uma empresa que valoriza a diversidade?
  • Muitas organizações posam com uma imagem de valorização dos colaboradores, mas eles realmente conseguem provocar a dissonância cognitiva ou se sentem intimidados?
  • Vocês realmente buscam a inovação aberta ou vivem em Câmaras de Eco?  

Uma das lições do autor é que colaboradores com as devidas capacidades técnicas para uma função, mas vindos de diferentes lugares e diferentes escolas, geram melhores resultados do que o pensamento único, individual, ou que pode estar sendo comprometido por clones que levam sempre aos mesmos resultados.

À venda: a obra pode ser adquirida neste link

Para mim, fica claro que a diversidade multidisciplinar e de pensamentos ajuda a enriquecer uma empresa e apoia a cultura da inovação.

Isso tudo mostra que a diversidade cria condições para construir formas diferentes de agir e causar impactos. Para nós da Haze Shift, faz total sentido pregar na cultura da inovação: prototipar, testar e falhar rápido a partir de ideias diferentes. Afinal, nada é uma verdade absoluta quando falamos em cultura de inovação.

Por fim, quero lembrar que existem diferentes formas de provocar novos pensamentos nas empresas, seja por meio da inovação aberta, da transformação digital ou do design estratégico. Essas áreas potencializam a cultura da inovação e nós podemos ajudar a desvendar junto com você qual seria o melhor processo para iniciar um trabalho de diversidade cognitiva na sua empresa. Pode ser um workshop online, um desafio de inovação aberta, um redesenho de processos, uma busca por startups que ofereçam serviços.

Vamos conversar para achar a melhor solução?

Escrito por:

Digital Transformation Leader & Co-Founder de Haze Shift | + posts

Certified facilitator of LEGO® SERIOUS PLAY® & Digital Transformation Enabler with a demonstrated history of working in the information technology and food & beverages industry.